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sexta-feira, 30 de outubro de 2020

ENTRE A ESPADA E A PAREDE - DIÁRIO DE UM ASSASSINO

A minha opinião:
De quando em quando sou surpreendida com um autor que desconhecia e um livro que nunca tinha reparado. Um amigo presenteou-me com o que mais prezo. Um mimo! 

Diário de um assassino. Um solitário, que por dinheiro matou mas não sente culpa. Apenas o inquieta a possibilidade de ser preso. E o mais incrível é que o leitor sente empatia por este narrador/ personagem que não manifesta agressividade e gosta de alinhar os pensamentos por escrito quando não consegue dormir. 

E que bem que escreve. Não se trata de uma escrita datada, com uma linguagem arcaica e rebuscada, de difícil compreensão, antes precisa e fluída, contida até, para uma narrativa corrida de um excerto da vida de um homem. Um homem que ao contrário do que imaginei não era um serial-killer ou um mercenário. Um homem simples e bem educado. 

O melhor elogio a este pequeno romance intemporal encontra-se na contracapa:

"Que este livro magistral não tenha tido nenhum êxito em 1933... mais extravagante ainda é."

Autor: Tristan Bernard
Páginas: 160
Editora: Sistema Solar
ISBN: 9789898833501
Edição: 2020/ julho

Sinopse: 

Não sinto remorsos. Se tenho qualquer coisa contra mim, não é ter matado. O que eu sinto é pena por ter envenenado a minha vida com esta ameaça de prisão.

 


Mas este «teatral» Tristan Bernard também escreveu romances, na maior parte defendidos da sua fulgurante veia humorística; inesperadas ficções que saíam de outro tom — por vezes amargo e sem nada que o ligasse ao que pontualmente se lia, caucionado pelo seu nome em páginas de revistas e jornais. Foi a sobrevoar esta segunda onda que Bernard, aos sessenta e sete anos de idade, publicou Aux abois (Entre a Espada e a Parede), o seu mais talentoso romance, como já é reconhecido por essa lucidez que a passagem do tempo — a grande varredora de glórias efémeras momento a momento construídas — concede ao julgamento desembaraçado dos compromissos e amiguismos que condicionam com tanta frequência a decisão crítica.

Tem-se dito que Entre a Espada e a Parede é um inegável devedor do Crime e Castigo de Dostoiévski, o mais célebre exemplo literário do acto assassino desmotivado […]; também se diz que foi inspirador do eixo central de L’Étranger de Albert Camus, embora não se conheça uma palavra deste autor que permita dar como firme uma tal filiação.

No que toca a Dostoiévski, depois de alguma semelhança entre os crimes frios do seu Raskolnikov e o deste Duméry, tudo é diferente porque o assassino russo se prolonga numa implacável peregrinação expiatória, enquanto o assassino de Aux abois vive numa ausência de sensação de culpa, numa entrega passiva e com qualquer coisa de entediada aos prazeres que a sua desenvolta situação financeira lhe proporciona.

Duméry está bastante mais próximo do Mersault de Camus; há nas duas narrativas uma história de tempo interior com sucessivas emoções a determinarem a forma como esse tempo se reflecte no tempo exterior; a personagem de Camus não sente, como a de Bernard, remorsos que lhe alterem a energia dos actos de vida, apenas lamenta as consequências práticas — os incómodos da ocultação, a fuga à Justiça — que lhe perturbam a comodidade do quotidiano. Serei ou não uma criatura abominável?, é aqui a crucial interrogação. Não é a pergunta que devo fazer. Verifico isto: não sinto remorsos. Se tenho qualquer coisa contra mim, não é ter matado. O que eu sinto é pena por ter envenenado a minha vida com esta ameaça de prisão.

Consentimento

A minha opinião:
Estarrecida li este romance autobiográfico de uma franqueza desarmante sobre uma relação ilícita de um homem maduro com uma adolescente carente e solitária. Um relato terrivelmente corajoso e simultaneamente um brilhante acerto de contas com este intelectual predador.

As personagens não tem nome próprio, apenas as iniciais. E nesta narrativa carregada de tensão não há lugar para a vulgaridade ou obscenidades, apenas a lucidez de quem refletiu sobre o assunto anos depois e o deixou como testemunho numa escrita sublime. Um tema que pode dar azo a polémica e sempre atual.

Um romance que é um grito de libertação. Um romance de intervenção. Quisera eu que muitos mais fossem os leitores a quem chegasse. 

Autor: Vanessa Springora
Páginas: 184
Editora: Alfaguara
ISBN: 9789897840494
Edição: 2020/ setembro

Sinopse: 
Paris, meados da década de 80: a jovem V. procura nas páginas dos livros algo que preencha o vazio de afecto deixado pelo divórcio dos pais. Com treze anos, num jantar, conhece G., escritor, figura da elite intelectual parisiense, semblante de monge budista e «olhos de um azul sobrenatural». Desconhece a reputação sulfurosa de que o escritor de cinquenta anos goza e desde o primeiro olhar é conquistada pelo magnetismo daquele homem, pelos olhares que lhe dedica. Depois de um meticuloso cortejo de algumas semanas, V.entrega-se a G. de corpo e alma.

O idílio amoroso chega ao fim quando V. percebe, com uma terrível desilusão, que G. coleciona relações com adolescentes e que faz das sucessivas conquistas a matéria-prima da sua obra literária. Debaixo da aparência melíflua de homem de letras esconde-se um perigoso predador, enfeitiçado pela juventude das suas vítimas, encoberto por uma sociedade complacente.

Mais de trinta anos volvidos sobre os factos, Vanessa Springora narra, de forma lúcida e fulgurante, esta história de amor e perversão. Uma história individual - a sua história com o escritor Gabriel Matzneff - que espelha tantas outras e que expõe as derivas de uma época deslumbrada pelo talento e pela celebridade. Corajoso e comovente, este romance autobiográfico incendiou o meio literário francês e reacendeu o debate sobre o consentimento um pouco por todo o mundo.


terça-feira, 27 de outubro de 2020

Terra Alta

A minha opinião:
Há algum tempo que não lia um romance policial tão fixe.

Terra Alta, fica na Catalunha. Não sabia. Sucintamente, o autor contextualiza onde se passa a ação numa escrita apurada e elegante, enquanto se trata da investigação de um triplo homicídio.

A história pessoal de Melchor prendeu-me obsessivamente até terminar de ler este livro. O romance "Os Miseráveis" mudou-lhe a vida. 

"... metade de um romance o põe quem o escreve e a outra metade, quem o lê."

Melchor é um grande leitor. E uma grande personagem, mas não a única. O Francês é uma personagem secundária que, pouco interveio, mas que me fascinou. O encontro com o romancista é das passagens que mais gozo me deram ler, numa história que não se limita ao crime. A desolação daquela terra, a pobreza do povo e o efeito da guerra não estão dissociados.

O crime é um enigma desafiante que Melchor não deixa encerrar e como tal, o final não podia deixar de ser empolgante e algo surpreendente. As questões que se impõem como a legitimidade da vingança e o valor da lei e da justiça perante duas verdades antagónicas foi bem resolvido. Muito, muito, muito bom.

Gostaria muito de continuar a segui-lo, mas não me parece muito provável. 

Autor: Javier Cercas
Páginas: 296
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03348-2
Edição: 2020/ outubro

Sinopse: 
Um crime terrível abala a pacata comarca da Terra Alta: os donos da sua maior empresa, as Gráficas Adell, aparecem mortos, barbaramente assassinados. Quem toma conta do caso é Melchor Marín, jovem polícia e leitor voraz que chegou de Barcelona quatro anos antes. Sobre os ombros carrega um passado obscuro que o converteu numa lenda junto das forças policiais, mas que ele acredita ter enterrado sob uma vida feliz como marido da bibliotecária da povoação e pai de uma menina chamada Cosette, tal como a filha de Jean Valjean, o protagonista d'Os Miseráveis, o seu livro preferido.

Com uma narrativa intensa e repleta de personagens memoráveis, este romance é uma reflexão lúcida sobre o valor da lei, a possibilidade de se fazer justiça e a legitimidade da vingança. Mas, mais do que tudo, é a epopeia de um homem em busca do seu lugar no mundo.

sexta-feira, 23 de outubro de 2020

A Vida Brinca Comigo

A minha opinião:
Vera era pragmática, decidida e impaciente e, como dizia de si própria, "sem a menor paciência para malvados e estúpidos". Vera tinha uma história difícil, antes de entrar na vida de Rafael e Túvia, o que tinha afetado profundamente Nina, a sua bela filha. Guili é a neta, filha de Rafael e Nina, que desde cedo os abandonou. Uma história agridoce, onde há amor e tristeza, que a escrita apurada de David não permite ignorar sem marcar.

"Temos filme?" A convivência de Vera, Nina, Rafi e Guili, com o tanto que têm para resolver de culpa, remorso ou vergonha, num filme dramático em que a protagonista é a nonagenária, mas em que todos têm de desempenhar bem o seu papel intenso. Vidas que viviam no fio da navalha.

"Em geral... a vida prega-me muitas partidas." diz Vera.

Um romance implacável. Quase fisicamente doloroso, dada a tensão que trespassa nas palavras.
E o amor absoluto que os unia. Uma viagem ao princípio, em que as memórias e as escolhas entram na equação. Uma viagem ao passado de má memória com o cruel conflito dos Balcãs.

Autor: David Grossman
Páginas: 328
Editora: Dom Quixote
ISBN: 9789722069854
Edição: 2020/ setembro

Sinopse: 
Por ocasião da festa dos noventa anos de Vera, Nina regressa a Israel: apanhou três aviões, que a trouxeram do Ártico até ao kibutz para se reencontrar com a euforia da mãe, a raiva da filha, Guili, e a veneração intacta de Rafi, o homem que, apesar de tudo, ainda perde todas as suas defesas quando a vê.

Desta vez, Nina não pretende fugir: ela quer que a mãe acabe por contar o que aconteceu na Jugoslávia durante a primeira parte da sua vida, quando, jovem judia croata, se apaixonou por Milosz, filho de camponeses sérvios sem terra. Nina quer saber mais sobre o seu pai, Milosz, preso sob a acusação de ser um espião estalinista. E porque é que Vera foi deportada para o campo de reeducação na ilha de Goli Otok, abandonando-a quando tinha apenas seis anos.

Para desvendar os mistérios do passado, Nina sugere um regresso ao lugar de horror que sugou Vera, marcando o destino de todas elas. A viagem de Vera, Nina, Guili e Rafi a Goli Otok acaba por se transformar num confronto dramático que quebra o silêncio, despertando sentimentos e emoções com a violência da tempestade que atinge as falésias da ilha. Uma viagem catártica, confiada à filmagem de uma câmara de vídeo, onde a memória e o esquecimento se fundem num único testemunho imperfeito.


domingo, 18 de outubro de 2020

Quem é amado nunca morre

A minha opinião:
Victoria Hislop escreve romances como ninguém que eu tenha lido, com base na História recente da Grécia. Marcantes porque reflectem as clivagens sociais e políticas que conduziram a profundos dramas familiares como é o do irmãos Koralis, que se iniciou em 1930. A cisma entre esquerda e direita dividiu o povo e com o termo da guerra perderam a humanidade numa narrativa tocante que trespassa o leitor através do profundo sentir das personagens.

Esta é a história de vida de Themis que a deixa como legado a dois netos. E é uma história impressionante de uma mulher comum com uma vida extraordinária de coragem e resiliência que aprendeu desde cedo o valor do silêncio. E mais tarde, da flexibilidade.

A escrita, as personagens e o enredo são de uma força que não se esquece e que em determinadas passagens até me deixou com falta de ar, mas a ligação com as crianças encheu-me o coração. Afinal, "quem é amado nunca morre" como dizia o poeta.

Autor: Victoria Hislop
Páginas: 432
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03379-6
Edição: 2020/ setembro

Sinopse: 

Atenas, abril de 1941. Tendo resistido a uma primeira tentativa de invasão, a Grécia é ocupada pelas potências do Eixo. Após décadas de incerteza, o país encontra-se dividido entre a direita e a esquerda políticas. Themis, então com quinze anos, vem de uma família separada por essas diferenças ideológicas. A ocupação nazi não só aprofunda a discórdia entre aqueles que a rapariga ama, como reduz a Grécia à miséria. É impossível ficar indiferente: na fome que se seguiu à ocupação, e que lhe levou os amigos, os atos de resistência são quase um imperativo moral para ela.

Porém, o sucesso de um dos movimentos de resistência mais eficazesna europa ocupada volta-secontra o próprio e, com o fim da ocupação, advém a guerra civil. Themis junta-se ao exército comunista, onde experimenta os extremos do amor e do ódio. Quando por fim é presa nas ilhas do exílio, encontra outra mulher cuja vida se entrelaçará com a sua de maneiras que nenhuma delas poderia antecipar, e descobre que deve pesar os seus princípios contra o desejo de viver.

Um romance poderoso, que lança luz sobre a complexidade e o trauma do passado da Grécia, a partir da vida extraordinária de uma mulher comum.

Festa de Família

A minha opinião:
Quatro jovens mulheres, muito diferentes umas das outras, mas entendiam-se muito bem e acabaram por se tornar amigas inseparáveis.

Histórias de vida em que Sveva Casati Modignani é especialista. Os romances são um deleite que não perco. Durante anos li todos os romances desta autora, que conquistou leitores e ganhou nome, mas por fim comecei a cansar (aparte que surgiu em conversa com uma boa amiga livrólica). Este romance reconciliou-me com a autora que conhece bem a natureza feminina e sabe contar histórias que nos aproximam de nós próprias. Romances que confortam. E não menos importante, apelam ao palato com a maravilhosa gastronomia.

A amizade destas quatro mulheres que se reuniam semanalmente para jantar e dar á lingua era um elo forte como o de uma familia. Mulheres batalhadoras e de sucesso. Um romance que reproduz as histórias de princesas que nos continuam a fazer sonhar. Mulheres que se impõem e realizam. 
Mais um romance da Sveva que é um bálsamo para a alma. E que bem que ela o sabe fazer.

Autor: Sveva Casati Modignani
Páginas: 280
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03386-4
Edição: 2020/ outubro

Sinopse: 
É quase Natal. Em Milão, num restaurante da Piazza Novelli já decorado de forma festiva, a proprietária prepara-se para receber as habituais clientes das quintas-feiras. Andreina, Carlotta, Gloria e Maria Sole: quatro jovens amigas que a cada semana se permitem um momento de conversa fiada e confidências. Duas solteiras, duas casadas, todas se debatem com as dúvidas do coração: relacionamentos que as fazem infelizes, homens que após grandes declarações e presentes preciosos desaparecem ou entram no modo chinelo e pensam que o maior desejo de qualquer mulher é um robot de cozinha.
Naquela noite, há um aniversário para comemorar. Mas há também uma confissão inesperada: Andreina está à espera de bebé.
Com um novo ano em perspetiva, e enquanto procura um pouco de paz na bela Villa Sans-souci de Paraggi, que herdou da avó materna, Maria Sole relembra o grande engano que foi o seu casamento e questiona-se sobre como foi possível não notar que o marido não era o que parecia, mesmo conhecendo-o desde a infância.
Refazendo as memórias contidas nos quartos da vila, a jovem percebe que a sua família sempre viveu envolta em secretismos, para não sujar a imagem de respeitabilidade. Felizmente, tem as amigas a seu lado, prontas para se apoiarem nos momentos difíceis.

Cada uma das quatro enfrenta o ano novo com um novo desafio e a sua força será o vínculo que as une como irmãs. Como uma família sincera.
Uma história de recomeços e afetos a manter como tesouros preciosos.

Dias de outono

A minha opinião:
Simplídade de escrita numa estória que nos parece próxima, como se o Miguel fosse mais um amigo que se questiona sobre o que fazer com a sua vida. Muito bom o que li e vi, com as belas fotos que marcam o início de cada capítulo.

De quando em quando, sempre que um livro me chama, faço uma incursão por autores portugueses e o gosto de encontrar a alma lusa nos usos e costumes e até nos cantos descritos ou nos aromas e paladares que não nos saem da memória, é um conforto bem vindo.Certamente, este romance foi feito com imenso carinho porque é raro encontrar uma personagem masculina tão conectada com os seus sentimentos e emoções que nos passa noções claras do que é primordial. O outono é uma estação de grande beleza, tal como este romance.

Sem ser uma narrativa virtuosa é tocante ao abordar vários temas mundanos e nada fáceis. Mas para saber mais é preciso ler este romance. Eu, adorei. E, se possível, irei repetir com os livros de José Rodrigues.

Autor: José Rodrigues
Páginas: 304
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03339-0
Edição: 2020/ setembro

Sinopse: 

«O sentimento de felicidade pode dar medo. Medo de que, de repente, tudo se desmorone. Que o coração gele, depois de aquecer. Que a pele esfrie, depois de recolher os melhores pedaços do Sol.»

Os dias de Miguel são divididos entre a intensa atividade profissional e o apoio a Teresa, a sua tia, institucionalizada com uma doença irreversível. Na família encontra o conforto dos seus dias agitados, com Catarina e os filhos André e Tiago.
As alterações recentes na administração do banco onde trabalha, a degradação do casamento e os problemas vividos pelo filho adolescente levam Miguel a questionar as opções de vida. Ao mesmo tempo, retoma as memórias mais antigas, incluindo a sua vila no interior e a casa onde nasceu e viveu, criado por Teresa, num ambiente de permanente felicidade.
Quando o mundo de Miguel parece desabar, passado e presente unem-se numa longa jornada de salvação e de mudança de prioridades, onde o amor se transforma no principal caminho para a reconstrução da felicidade, mesmo quando a perda e a saudade pareciam não querer dar tréguas…

domingo, 11 de outubro de 2020

A Terceira Índia

A minha opinião:
Não me seduziu de imediato mas ao ler alguns comentários lisonjeadores fiquei intrigada, inclusive com o título que associei e bem ao aspecto da protagonista. A premissa agradou-me com um tema que a autora certamente saberia explorar bem como a infertilidade.


O explanar do namoro e casamento da menina bonita freak e o beto católico de olhos verdes fulgurantes em mais de cem páginas, ainda que a escrita seja ótima, levou-me a questionar o público-alvo, dada a maturidade das personagens. O que me divertiu muito em toda a trama foram as fúrias e a relação com a amiga Joana.


Retomando, na segunda parte, Sofia saiu da sua zona de conforto e viajou para Moçambique onde encontra um companheiro de viagem bruto e grande como um urso e como os opostos se atraem há uma dinâmica de picardia e envolvimento que dura outras muitas cento e tal páginas com referências ao povo, modo de vida e cultura dos moçambicanos. As mulheres e as crianças como o elo mais fraco de uma cadeia numa aventura perigosa numa terceira parte.


Leitura leve, vivaça e bem disposta. Um romance de fácil leitura e muito cativante. Os dois relacionamentos da protagonista são o foco com muitos diálogos, em que as opiniões das leitoras podem dividir-se para o melhor companheiro para Sofia.


Conhecer e conversar com a autora foi muito bom e compreendi melhor tudo o que envolvia este romance. Obrigada Iris. Foi um prazer.



Autor: Iris Bravo
Páginas: 484
Editora: Cultura
ISBN: 9789898979551
Edição: 2020/ julho

Sinopse: 
Sofia tem 32 anos, é professora num colégio em Lisboa e casada com um arquiteto de uma família nobre ribatejana. Ele conservador e ela liberal, não tinham nada em comum quando se apaixonaram numas férias de verão dez anos antes. Viveram um namoro feliz seguido de um casamento de sonho, desgastado pela sua obsessão por uma gravidez.

Quando descobre que foi traída, Sofia aceita uma proposta para substituir a sua mentora e viaja para o interior de Moçambique.
Disposta a viver aventuras, envolve-se com Alex, um homem que a atrai, apesar dos seus modos secos e do pressentimento de que lhe esconde algo.

Corajosa e determinada, Sofia irá descobrir tudo aquilo de que é capaz, incluindo arriscar a sua vida.

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Um castelo em Ipanema

A minha opinião:

MA-RA-VI-LHO-SO!

Como um mergulho em uma praia deserta terminou na construção de um castelo em Ipanema… Uma experiência inolvidável de leitura desde as primeiras páginas. Leveza e ligeireza numa narrativa colorida como um quadro em movimento.

A história de Ipanema até à década de oitenta com amores irrealizados e tragédias pessoais numa linguagem cantada que merece ser lida em voz alta. Histórias de gente que viveu ali muito tempo e há tanto tempo. "Brigas, conciliações, choramingos, chamegos, petulâncias, elucubrações, modinhas, surpresas, desilusões, mentiras, gargalhadas, apostas, temores, desconfianças, tentações, sonhos e promessas, planos e devaneios." (pág. 159) Não há como negar que está escrito em português do Brasil e é tão bom que esmaga todos os preconceitos. Um romance encantador que não se consegue parar de ler.
Tantas mudanças em Ipanema, no Rio, no Brasil. E na família Jansson em três gerações que acompanharam o avanço do seu mundo.

Autor: Martha Batalha 
Páginas: 288
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03381-9
Edição: 2020/ setembro

Sinopse: 
Rio de Janeiro, 1968.
Estela, recém-casada, mancha com lágrimas e rímel a fronha bordada do seu travesseiro. Uma semana antes ela estava na festa de passagem de ano que marcaria de modo irremediável o seu casamento. Estela sabia decorar uma casa, receber convidados e preparar banquetes, mas não estava preparada para o que aconteceu nesse dia.

Setenta anos antes, Johan Edward Jansson conhece Brigitta também durante uma festa de passagem de ano, em Estocolmo. Casam-se, mudam-se para o Rio de Janeiro e constroem um castelo num lugar ermo e distante do centro, chamado Ipanema.

Em Um castelo em Ipanema, Martha Batalha conta-nos como essas duas festas de Ano Novo definem a trajetória dos Jansson ao longo de 110 anos. É uma saga familiar imersa em história, construída com humor, ironia e sensibilidade. A riqueza e a complexidade dos múltiplos personagens criados pela autora permitem tratar de temas que se entrelaçam e definiram a sociedade brasileira nas últimas décadas, como o sonho da ascensão social, os ideais femininos e feministas, a revolução sexual, a reação ao golpe militar, a divisão de classes, a deterioração do país.

Um romance comovente sobre escolhas e arrependimentos, sobre a matéria granular da memória e as mudanças impercetíveis e irremediáveis do tempo.

As três vidas

A minha opinião:

Não muito convencida peguei neste romance para o Clube À descoberta de João tordo. O anterior, referente ao mês de agosto, não me tinha enchido as medidas (ao contrário da maioria das pessoas que o leu). Acho que tinha expectativas elevadissímas e por consguinte para este romance eram baixíssimas. Decidi confirmar e para minha grande surpresa, a fluidez da narrativa cativou-me de imediato. Uma história mirabolante porque viver com um fascista é muito mais perigoso e sedutor do que um comunista, porque sabem à partida daquilo que são capazes.

Um grande enigma. A trama desenvolve-se num ambiente de grande mistério que vicia. O cenário na Quinta do Tempo em Santiago do Cacém nos anos oitenta e a ação que remonta a anos anteriores com a espionagem em tempo de guerra, numa narrativa em torno de Millhouse Pascal e o anónimo testemunho de quem expiar os seus pecados. As três vidas numa coreografia de desastre iminente.

Negros sentimentos envolvem as personagens que abraçam a culpa e a solidão. O autor, nos seus romances apresenta personagens marcadas ou sofridas com frequência e este romance não foi exceção. Contudo, o que me enredou foi o humanismo e o desfecho das personagens. Valeu.

Autor: João Tordo
Páginas: 480
Editora: Casa das Letras
ISBN: 9789896656126
Edição: 2020/ março

Sinopse: 
História de amor, saga familiar, mistério policial, retrato de um mundo que ameaça resvalar da corda bamba, Três Vidas é um dos mais importantes romances de João Tordo, tendo-lhe valido o Prémio Literário José Saramago.
António Augusto Milhouse Pascal vive longe do mundo, num velho casarão alentejano, com os três netos pouco dados a regras e um jardineiro taciturno. O isolamento é quebrado pelas visitas de clientes abastados que procuram ajuda do velho patriarca, em tempos um importante espião e contra-espião, testemunha activa das grandes guerras do século XX. O nosso narrador - um lisboeta de origens modestas - entra na história quando Milhouse Pascal o contrata como arquivista dos segredos que envolvem os seus clientes. Não poderia adivinhar o rapaz, ao aceitar o trabalho, que este acabaria por consumir a sua própria vida. A partir do momento em que se apaixona por Camila, neta do patrão com sonhos de ser funambulista, que desaparece após uma viagem a Nova Iorque, o destino do narrador enreda-se irreversivelmente nos mistérios da família, partindo a sua existência em três.