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sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Um Lugar ao Sol seguido de Uma Mulher

 

A minha opinião:

O terceiro livro que li de Annie Ernaux. Duas narrativas compiladas bnum único volume com os progenitores como personagens centrais em que mantêm o seu estilo desassombrado numa viagem no tempo que inicia com o fim das suas vidas. Escrita regulada que impõe uma leitura ponderada.

"Escrevo lentamente. Esforço-me por revelar a trama significativa de uma vida num conjunto de factos e escolhas, e tenho a impressão de perder gradualmente a figura particular do meu pai."

Agridoce. Memórias que nos transportam para momentos felizes ou terríveis, de alienação. Annie consegue que o leitor reviva aquelas situações e sensações consigo, colando-as às suas próprias vivências. É isso que faz dos seus romances especiais. O seu partilhado e muito sentido que se pode tornar avalassador. Orgulho.

"O que espero escrever de mais justo situa-se sem dúvida na conjugação do familiar e do social, do mito e da história."

Autor: Annie Ernaux
Páginas: 152
Editora: Livros do Brasil
ISBN: 978-989-711-203-4
Edição: Novembro/2022

Sinopse:
Dois meses depois de passar nos exames finais para se tornar professora, o pai de Annie Ernaux morreu. Revisitando a memória da sua vida, no que ela teve de mais particular, repleta de confiança no trabalho árduo e igual dose de sonhos frustrados, complexos de inferioridade e vergonha, uma filha procura preencher um vazio que é seu, traçando em simultâneo um retrato coletivo sobre uma época, um meio social, uma ligação familiar. Pouco depois, também a mãe desapareceu, após uma doença prolongada que lhe arrasou a existência, intelectual e física, e mais uma vez cabe à filha restaurar, através da palavra escrita, a sua presença na história. Neste volume reúnem-se os dois textos de Annie Ernaux sobre estas perdas: Um Lugar ao Sol, sobre o pai, publicado em 1984 e vencedor do Prémio Renaudot, e Uma Mulher, sobre a mãe, lançado em 1988. Duas peças literárias fulgurantes, misto de biografia, sociologia e história, onde resplandece a ambivalência dos sentimentos que unem filhos e pais e o impacto da quebra desse elo vital.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Talvez Devesses Falar com Alguém

 

A minha opinião:

A capa é colorida, com um pacote de lenços de papel e temos tendência a desconfiar de capas assim, considerando os livros como superficiais ou banais. Assim como se desconfia de terapeutas. E talvez devesses ler este livro para mudar de perspectiva. Talvez seja possível falar com alguém e ficar com a sensação de sentir que nos sentem. 

Uma história acerca de terapia: acerca de como nos curamos e de onde a terapia nos leva. A narradora, terapeuta, não escreve apenas sobre esse papel mas também como paciente quando teve que fazer uma "gestão" de crise.

Talvez estee livro se insira na categoria de livros de autoajuda mas é tão divertido e tocante, cheio de histórias comuns que dão que pensar sem maçar, que se lê rápidamente. Um livro despretensioso e eficaz. Um livro de partilha de Lori. Ás vezes vale a pena arriscar.

Autor: Lori Gottlieb
Páginas: 464
Editora: Self PT
ISBN: 9789899032293
Edição: Fevereiro/2022

Sinopse:
Da autora bestseller do New York Times, psicoterapeuta e colunista nacional de aconselhamento, este é um livro hilariante, provocador e surpreendente, que nos leva aos bastidores do mundo de uma terapeuta - um lugar onde os seus pacientes estão à procura de respostas (e ela também!). Num dia Lori Gottlieb é uma terapeuta que ajuda pessoas no seu, no outro uma crise faz o seu mundo desabar. Subitamente entra na história Wendell, um terapeuta peculiar mas experiente, em cujo escritório ela "aterra". Com uma sabedoria e humor surpreendentes, Gottlieb convida-nos a entrar no seu mundo como profissional e paciente, examinando as verdades e ficções que contamos a nós próprios e aos outros enquanto oscilamos na corda bamba entre o amor e o desejo, o significado da vida e a mortalidade, a culpa e a redenção, o terror e a coragem, a esperança e a mudança. Este é um livro revolucionário na sua transparência e oferece um passeio profundamente pessoal mas universal pelos nossos corações e mentes.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

O Meu Ano de Repouso e de Relaxamento

 

A minha opinião:

Gostei muito de Eillen, portanto O meu ano de repouso e de relaxamento não me podia passar ao lado. Improvável que algum livro desta autora não seja lido. Amarga mas sacia. E apetece repetir.

"Passavam-se muitas coisas em Nova Iorque - como sempre - mas nada disso me afetava. Era o que o sono tinha de maravilhoso - a realidade distanciava-se e surgia na minha mente com a simplicidade de um filme ou de um sonho."

Hibernar. Incrível. E partir desta ideia para uma boa estória ainda o é mais. Uma protagonista com recursos financeiros que decide que é o que lhe convém e com a colaboração de uma terapeuta muito peculiar vive uma experiência que tem muito de rejeição. A sua percepção é uma finíssima crítica social. 

Uma protagonista, sem nome, que se pode detestar mas que à medida que a fui conhecendo fui apreciando. E tal como Eileen não se esquece. Tortuosa como parecem serem as personagens de Ottessa.

Autor: Ottessa Moshfegh
Páginas: 216
Editora: Relógio D'Água
ISBN: 9789897832871
Edição: Outubro/2022

Sinopse:
Ottessa Moshfegh, uma das mais importantes novas vozes literárias, narra neste romance os esforços de uma jovem mulher para se esquivar aos males do mundo.

Para tal, embarca numa hibernação prolongada, com a ajuda de uma das piores psiquiatras da história da literatura e com as enormes doses de medicamentos por ela prescritos.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Pequenas Coisas como Estas

 

A minha opinião:


Desde que li a sinopse deste pequeno livro que não parava de pensar nele e no quanto o queria ler mas depois de o ler e poucas horas bastam para o fazer continuo a pensar nele. Bill Furlong é um homem bom. Inquieto e essa sensação passa para o leitor que tal como eu é uma pessoa boa. Uma vida dura, de muito trabalho, numa época terrível. As pequenas coisas agarram-no mas também são as pequenas coisas que se avolumam para o levar a mudar e a enfrentar uma situação que deveria ter existido apenas na ficção. Maravilhoso e perturbador. Se não incomodar, algo não está bem. Conciso e tão preciso que é brilhante. 

Autor: Claire Keegan
Páginas: 96
Editora: Relógio D'Água
ISBN: 9789897832864
Edição: Outubro/2022

Sinopse:
Estamos em 1985, numa pequena cidade irlandesa. A autora narra-nos a vida de Bill Furlong, um comerciante de carvão e pai de família.


Uma manhã, ainda muito cedo, quando vai entregar uma encomenda no convento local, Bill faz uma descoberta que o leva a confrontar-se com o passado e os complicados silêncios de uma povoação controlada pela Igreja.

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

A Casa Holandesa

 

A minha opinião:

A Casa era a História. A Casa Holandesa, como ficou conhecida, tratava-se do lugar onde viviam aqueles holandeses de nome impronunciável. Danny é o narrador que retoma ao passado para contar a história da sua familia desde que foram viver para aquela casa singular. Numa escrita clara e objetiva a história avança rapidamente e vicia porque as personalidades vincadas daquelas personagens provocam sentimentos de admiração e repulsa. E como leitora não conseguia esquecer Maeve, Danny, Andrea e Celeste. Pretendia saber mais sobre o desenrolar dos acontecimentos até ao desfecho que envolvia A Casa Holandesa. 

Não li Comunidade mas sei que não vou perder qualquer romance desta autora. Sagas familiares é o que mais gosto de ler, em que há laços afetivos de todo o tipo e circunstâncias que mudam vidas. Algumas determinam. E em que não faltam pessoas especiais. E mais não conto sobre este romance maravilhoso. Inesquecível.

Autor: Ann Patchett
Páginas: 312
Editora: Cultura Editora
ISBN: 9789898860286
Edição: Novembro/2022

Sinopse: 
Em 1946, após a Segunda Guerra Mundial, Cyril Conroy, um homem pobre, enriquece repentinamente com um investimento fortuito. A primeira compra que faz é uma opulenta propriedade nos subúrbios de Filadélfia, nos EUA, antes pertencente a uma família neerlandesa, entretanto arruinada. Conroy muda-se, com a mulher, Elna, e a filha, a confiante e protetora Maeve, para a nova casa, na qual já nascerá Danny, o narrador desta história.

O que seria uma agradável mudança de vida, torna-se no desmoronamento de toda a família, numa espécie de paraíso perdido. Elna, incapaz de lidar com as mordomias da propriedade e respetivos empregados, termina o casamento e foge, deixando também os filhos.

Mais tarde, chega à propriedade uma madrasta, Andrea, uma jovem viúva com duas filhas, e os dois irmãos, Maeve e Danny, vão sendo afastados aos poucos, até que acabam expulsos da própria casa, devolvidos à pobreza, podendo contar apenas um com o outro para lidar com a perda, com a humilhação, com a raiva, até que um dia possam, enfim, confrontar quem os abandonou.

A Casa Holandesa, uma narrativa que percorre cinco décadas, é uma saga familiar, uma viagem lenta, sofrida, com personagens que ficarão para sempre connosco, como num conto de fadas virado do avesso.

domingo, 11 de dezembro de 2022

Um Cão no Meio do Caminho

A minha opinião:

Se quando o abri e li o primeiro capítulo este livro era uma promessa, quando prossegui tornou-se uma certeza. Um romance honesto e visceral sobre duas personagens que vale a pena conhecer.

A escrita de Isabela Figueiredo é marcante e segura. Um daqueles romances que apetece ler em voz alta para apreciar a sonoridade das palavras e o sentido ecoar dentro de nós. A beleza do vulgar que não contemplamos.

Duas personagens que recolhem o que os outros deixam e que às tantas ficam ancorados próximo, quebrando deste modo a profunda solidão em que viviam. Duas personagens livres. Duas personagens com história. Duas personagens com vivências e memórias que nos são comuns. Duas personagens inesquecíveis. 

E é tão bom quando um romance nos envolve, emociona e nos marca por tantas razões. Como eu gosto de romances assim.

Autor: Isabela Figueiredo
Páginas: 296
Editora: Editorial Caminho
ISBN: 9789722131872
Edição: Novembro/2022

Sinopse: 
Este novo romance de Isabela Figueiredo, a que ela deu o sugestivo e justificado título de Um Cão no Meio do Caminho, conta-nos as histórias de um homem e de uma mulher que sofrem, cada um à sua maneira, um dos grandes males da vida moderna - a solidão.

Neles a solidão é a resposta aos violentos acidentes com que a vida os agrediu. As sociedades modernas vivem sobre a violência. Mas há quem a recuse, como é aqui o caso de José Viriato e da sua misteriosa vizinha, Beatriz, que todos conhecem como a Matadora. O acaso junta-os, como o leitor verificará com a leitura deste livro.

Que resultado obtemos quando se juntam duas solidões? É esta a questão que este novo romance da autora do aclamado A Gorda vem equacionar, deixando a resposta ao critério de cada leitor. Eventualmente um cão pode ajudar.

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Misericórdia

 

A minha opinião:

"Sou muito velha, sei que o encantamento deve ser conservado em seu próprio vaso, de contrário transborda e desfaz-se em nada." A história é nova e o encantamento não se desfaz, com esta personagem simples e grandiosa, de grande visão e muito acutilante. A sabedoria da maturidade e da experiência que tanto enriquece.

Ao longo da narrativa refleti sobre o título deste romance em que a força desta mulher não se queda no Hotel Paraíso, a residência geriátrica onde se encontra internada por se encontrar limitada de movimentos. "...no interior desta casa, lugar de exílio, existe um circo Mariani. Malabarismos e palhaçadas, a vida em imitação, com encontros e desencontros como numa tramoia de farsa."

Misericórdia é uma palavra que se impõe e exige respeito. Como D. Maria Albertina Nunes Amado que ainda com dificuldades não deixa de registar os seus dias e expressar as suas vontades. E que experiência de leitura enriquecedora acompanhar esta mulher com um mundo dentro de si que não se condiciona pelo espaço ou pelo tempo e cria laços com os outros que a rodeiam e com o leitor que a acarinha desde as primeiras páginas. Pequenos capítulos para compreender que a velhice e decrepitude os empurrou para o exílio em que nada lhes pertence.

Escrita suave e exemplar ao qual estou rendida nesta belíssima história.

Autor: Lídia Jorge
Páginas: 464
Editora: Dom Quixote
ISBN: 9789722075718
Edição: Outubro/2022

Sinopse: 
Misericórdia é um dos livros mais audaciosos da literatura portuguesa dos últimos tempos. Como a autora consegue que ele seja ao mesmo tempo brutal e esperançoso, irónico e amável, misto de choro e riso, é uma verdadeira proeza.

Não são necessárias muitas palavras para apresentá-lo - o diário do último ano de vida de uma mulher incorpora no seu relato o fulgor das existências cruzadas num ambiente concentracionário, e transforma-se no testemunho admirável da condição humana.

Isso acontece porque o milagre da literatura está presente. Nos tempos que correm, depois do enfrentamento global de provas tão decisivas para a Humanidade, esperávamos por um livro assim. Lídia Jorge escreveu-o.

Doidos por Livros

 

A minha opinião:

Os dois últimos livros que li foram intensos e procurava algo... como uma comédia romântica. Divertido e nada, nada exigente e não tolo porque não tenho pachorra para lamechices ou amores adolescentes. Nada contra mas não era o que pretendia. Como que depois de um regime saudável precissasse de me lambuzar com uma extravagância muito doce.

Doidos por livros tem... Livros. Algumas referências. E disso gosto. Um bónus. E gosto dos protagonistas. 

Curioso é como brinca no enredo com os clichês, nomeadamente com as personagens-tipo. A dinâmica que prende e cumpre como devia são os divertidos diálogos do casal maravilha de protagonistas e das duas irmãs. O que não contava é que fosse um livro com mais de 400 páginas e poderia tornar-se enfadonho mas o que se vai desvendando sobre as personagens manteve a minha atenção e interesse. O final...bem...

Autor: Emily Henry
Páginas: 432
Editora: Quinta Essência
ISBN: 9789896615338
Edição: Novembro/2022

Sinopse: 
Nora vive para os livros. É agente literária e defende os seus escritores apaixonadamente.
Charlie é editor literário e tem o dom de publicar bestsellers. E é o inimigo n. º 1 de Nora.
Nora adora a sua profissão e não se imagina a viver noutro sítio que não Nova Iorque. O que ela não adora é a sua vida amorosa. Já perdeu relações suficientes por não se conformar com o papel de namorada dócil e caseira. Está farta! Por isso, quando a sua irmã, Libby, lhe propõe uma viagem a duas, Nora aceita. Sunshine Falls, uma amorosa vila na Carolina do Norte onde decorre a ação do bestseller do momento, está longe de ser o seu destino de férias ideal. Mas Libby escolheu esta radical mudança de cenário de propósito para incentivar a irmã a viver a vida de forma real e autêntica e não apenas através dos livros. Durante um mês, Libby tudo fará para que Nora seja a protagonista da sua própria história (romântica, de preferência).

Mas em vez de piqueniques em prados, encontros casuais com um atraente médico de província ou lenhador escultural, Nora está sempre a dar de caras com… Charlie, que teve a lata de rejeitar um dos seus livros, anos antes. Nora não é nenhuma heroína. Charlie está longe de ser um herói. Mas à medida que continuam a esbarrar um no outro - numa série de coincidências típicas dos melhores romances -, o que descobrem sobre si próprios supera (de longe!) a ficção.

quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Naufrágio

 

A minha opinião:

Gosto de um romance que seja de fácil entendimento, direto, em que a narrativa não tenha muitos subterfúgios, flua, como este romance de João Tordo. Jaime Tordelo é um homem de meia idade que sofre um bloqueio de escritor quando a doença irrompe o idílio que tinha começado com uma nova vida. Um telefonema desvenda um movimento associado a um outro maior que o tinha como protagonista. E a empatia que sentia muda na medida da percepção da história quando Alice surge na narrativa. Inquieta como um bom romance o deve fazer para conduzir à reflexão.

Naufrágio. É mesmo disso que se trata. Um afundamento. Um mergulho profundo em que não se sabe se volta à tona. E o leitor sabe o que se passou porque tem uma perspectiva privilegiada. A ignorância no desfecho prende a esta narrativa. 
Enfim... Um romance bem conseguido que não é amargo, sombrio ou denso. E é disso que gosto nos últimos romances de JT.

Autor: João Tordo
Páginas: 320
Editora: Companhia das Letras
ISBN: 9789897845390
Edição: Abril/2022

Sinopse: 
O novo romance de João Tordo conta-nos a história de um homem à deriva, enredado nos seus fantasmas e obrigado a enfrentar a mais terrível das acusações.

Aos sessenta anos, o romancista Jaime Toledo enfrenta vários problemas. Não escreve há uma década, foi diagnosticado com cancro e, de repente, dá por si no epicentro de um escândalo. Escritor de renome em Portugal, a polémica lança-o para o abismo - sem carreira, sem dinheiro e sem casa, com os livros a ganhar pó nos armazéns, depois de banidos pela sua editora, toma uma decisão radical: deixar tudo para trás e mudar-se para um barco decrépito, fundeado nas docas de Lisboa. É no Narcisse - um minúsculo barco mágico -, na companhia de uma velha guitarra e de um cão chamado Sozinho, que Jaime procurará devolver o sentido à sua vida, reconciliando-se com o passado: as relações conturbadas com as mulheres, o abandono da escrita, a culpa que o corrói.

Até que, um dia, a aparição de uma figura do passado mudará tudo, desviando a narrativa para um lugar inesperado. Estará nas mãos de Jaime decidir se este naufrágio é o fim ou um caminho para algo novo.

Naufrágio é um corajoso romance sobre o amor e as relações entre os sexos, uma reflexão sobre a memória e a culpa, e as linhas difusas que definem as fronteiras pessoais, sociais e morais. Através de Jaime Toledo, João Tordo traça o perfil de um homem em busca da redenção possível, num mundo mais rápido a julgar do que a refletir, e onde é mais fácil condenar do que estender a mão.

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

Mãe, Doce Mar

A minha opinião:

João Pinto Coelho não desilude. Os seus romances superam as minhas expectativas e por isso apresso-me a ler o que escreve. O problema é a ressaca literária que se segue.

Três personagens centrais numa narrativa autoficcionada. Um míudo que inicia a sua história quando reencontra a mãe nos EUA aos 12 anos, a própria mãe que desertara e o abandonara sem explicação e o padre jesuíta O'Leary. Três personagens enigmáticas e muito vividas, baseadas na experiência pessoal do autor num primeiro romance que se distancia do Holocausto e das vitimas. Um romance que tem a força do mar como reflexo das tempestades que os assolam. E em belas palavras se constroi grandes imagens que leio e releio enquanto cada uma se expressa na sua vez.

O final, esse continua a ser surpreendente como todos os outros. Ainda que conte com essa possibilidade, não consigo imaginar semelhantes desfechos que tanto relevo dão aos seus romances. Algo sombrio mas magnético nestas curtas vidas não cumpridas que regressam ao que deixaram.

Autor: João Pinto Coelho
Páginas: 200
Editora: Dom Quixote
ISBN: 9789722075886
Edição: Outubro/2022

Sinopse: 
Depois de passar a infância num orfanato, Noah conhece finalmente Patience, a mãe, aos doze anos. Mas, apesar de ela fazer tudo para o compensar, nunca se refere ao motivo do abandono; e, por isso, seja na casa de praia de Cape Cod, onde passam temporadas, seja no teatro do Connecticut onde acabam a trabalhar juntos, há um caminho de brasas que teima em separá-los mas que nenhum ousa atravessar.

Quando Noah encontra Frank O’Leary - um jesuíta excêntrico que guia um Rolls-Royce às cores -, descobre nele o amparo que procurava. Mesmo assim, há coisas que o padre prefere guardar para si: os anos de estudante; o bar irlandês de Boston onde ele e os amigos se encharcavam de cerveja e recitavam poemas; e ainda Catherine, a jovem ambiciosa que não temeu desviá-lo da sua vocação.

É, curiosamente, a terrível experiência de solidão num colégio religioso o primeiro segredo que Patience partilhará com Noah; contudo, quando essa confissão se encaixar no relato do padre Frank, ficará no ar o cheiro da tragédia e a revelação que se lhe segue só pode ser mentira

domingo, 30 de outubro de 2022

A Camareira

 

A minha opinião:

Somos todos iguais de maneiras diferentes. Uma boa história para uma grande lição. Uma lição que já tinha aprendido com A Educação de Eleanor de Gail Honeyman. E que neste romance compreendi melhor. Uma mulher admirável que era invisível. Uma mulher que era manipulada e finalmente quando descobre um hóspede morto é arrastada para a investigação.

Genial romance de mistério e intriga, com grandes personagens e muitas reviravoltas, narrada pela perspectiva menos provável mas muito intuitiva e inteligente, sem que deixe pontas soltas. Engenhoso e bem concebido é um romance que enreda o leitor de tal modo que se abstrai de tudo o resto até o terminar.

Autor: Nita Prose
Páginas: 328
Editora: Editorial Presença
ISBN: 9789722369893
Edição: Outubro/2022

Sinopse: 
Sejam bem-vindos. Sou a vossa camareira. Entro nos vossos quartos e conheço os vossos segredos.
Molly, a camareira, está completamente sozinha no mundo. Sim, está habituada a ser invisível, e é isso mesmo que também é no Regency Grand Hotel, onde, todos os dias, dobra roupa, faz as camas dos quartos de lavado, põe miniaturas de champô e pequeninos sabonetes nas casas de banho, limpa o pó e os segredos que os hóspedes deixam para trás quando fazem check-out. Ela é apenas uma camareira - porque haveria alguém de reparar nela?

Mas isso está prestes a mudar radicalmente. Todos os holofotes se viram para Molly quando é ela quem descobre o famigerado Mr. Black morto e bem morto na cama da sua suíte. Este não é o tipo de confusão que Molly pode limpar rapidamente. Porém, à medida que a teia de mentiras, sussurros, pistas e enganos se vai espalhando pelos corredores do Regency Grand Hotel, ela descobre que tem, dentro de si, um dom para a investigação. Sim, é apenas uma camareira - mas o que conseguirá Molly ver que todos os outros ignoram?

Mistério, suspense e muitas reviravoltas no romance que está a apaixonar leitores em mais de vinte países. Como pode uma pessoa ser, ao mesmo tempo, tão normal e extraordinária?

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

A Casa Ocupada

 

A minha opinião:

A capa e a sinopse deixaram-me "em pulgas", que é como quem diz ansiosa por o ler e não resisti. E desde logo se percebe que a escrita é maravilhosa, assim como a estrutura narrativa é de alguém que sabe o que faz e depois de pesquisar um pouco apurei que é um primeiro romance porque a incursão na escrita tem sido por outros géneros literários. 

As personagens bem definidas têm alma e cativam, bem como nos transportam para o tempo e espaço referidos. Retratos de época. O enredo, esse como o título indica gira em torno de uma casa centenária transformada e dos seus ocupantes, mas vai alargando ao circulo próximo da narradora com muita graça e humor. Um romance endiabrado que nos leva para ambientes privilegiados e descontraídos com vislumbres da nossa História.

Gostei tanto que li sem parar (também é um romance pequeno). Sei que pareço maçadora ou deslumbrada mas eu leio o que me apetece e faço breve quanto mais gosto. Graça Videira Lopes que romance bom.

Autor: Graça Videira Lopes
Páginas: 200
Editora: Dom Quixote
ISBN: 9789722075732
Edição: Setembro/2022

Sinopse: 
Um brasileiro torna-viagem mandou construir um palacete à Junqueira, em Lisboa, em 1889, para nele instalar a numerosa prole que não cessou também de aumentar fora de casa. O edifício - abandonado pelos anos 1950 e ocupado na sequência da revolução de abril de 1974 - está hoje transformado num condomínio de luxo onde moram Pedro e Júlia, um jovem casal de economistas.

É pela voz de Júlia - curiosa sobre o passado da casa -, mas também da sua cunhada Sofia, do namorado desta e de outros narradores, que vamos conhecendo não só as histórias das próprias personagens, mas também as que elas vão gradualmente descobrindo: a do republicano José Anastácio, o primeiro proprietário do palacete; e a do pai de Pedro e de Sofia, maoista em tempos da Revolução de 1974 e empresário de sucesso muitos anos depois.

Inteligente, divertido e cheio de surpresas, este romance - finalista do Prémio LeYa em 2021 - toma as décadas anteriores à implantação da República, os anos da Revolução de Abril e os tempos atuais como contexto e cenário, para nos oferecer um retrato breve e irónico de algumas elites portuguesas, desde finais do século XIX até aos nossos dias.

Todos os Lugares Desfeitos

 

A minha opinião:

Não sei explicar muito bem o apelo para ler certos livros. Ainda hesitei porque supus que seria mais um livro sobre a Segunda Guerra Mundial (ainda que O rapaz do Pijama às Riscas não o seja) ou mais concretamente sobre o que se seguiu (que me interessa por ler menos em ficção).

Mas quando uma personagem me conquista nas primeiras páginas e quero conhecer a sua vida marcada pela culpa e pela vergonha, acertei na escolha. Gretel, na plenitude dos seus 91 anos é uma personagem com muito para contar desde que fugiu de Berlim com a mãe. O passado vai sendo desvendado gradualmente e não sem surpresas que, prendem a uma narrativa de uma mulher invulgar, que não esqueceu o irmão de nove anos. Uma mulher que provoca um misto de emoções no leitor quando interage com Henry e a principal razão porque li compulsivamente.

Autor: John Boyne
Páginas: 368
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03601-8
Edição: Setembro/2022

Sinopse: 
A aguardada sequela do bestseller mundial O Rapaz do Pijama às Riscas
Gretel Fernsby tem 91 anos e vive em Londres há décadas, sempre no mesmo quarteirão de luxo. Leva uma vida confortável e tranquila, apesar do seu passado sombrio. Nunca fala da sua fuga da Alemanha, mais de setenta anos antes. Nunca fala dos anos do pós-guerra, passados em França com a mãe. Sobretudo, nunca fala do pai, o comandante de um dos mais infames campos de concentração nazis.
É então que uma jovem família se muda para o apartamento por baixo do seu, e Gretel acaba por fazer amizade com Henry, o filho do casal, apesar de o seu rosto lhe trazer memórias que ela prefere esquecer. Quando Gretel é confrontada com a escolha entre a sua própria segurança e a de Henry, sabe que está perante a oportunidade de expiar a sua culpa, mesmo que isso a obrigue a revelar os segredos que passou a vida a proteger.
Todos os lugares desfeitos é uma história devastadora e imensamente bela sobre uma mulher marcada por um terrível passado e por um presente onde nunca é tarde para a coragem e para a redenção.

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Cada Verão Passado

A minha opinião:

De quando em quando gosto de um romance simples, despretensioso, que apenas use a linguagem dos sentidos e dos afectos. Cada Verão Passado é exatamente aquilo que parece ser e é maravilhoso por isso. Um romance que apela ao melhor das memórias do que se vive em liberdade, paixão e alegria de viver, enquanto nos transporta para as nossas próprias ternas recordações. 

Percy e Sam afastaram-se e alternando entre o agora e dezasseis anos vamos recuperando a ligação que nunca se perdeu. E quão divertido é, sem ser idiota. 

Um romance com belíssimas personagens que nos acompanham mesmo quando fechamos o livro (ou o ebook). Perfeito para dias de chuva.

Autor: Carley Fortune
Páginas: 322
Editora: TopSeller
ISBN: 9789896236472
Edição: Setembro/2022

Sinopse: 
A juventude de Percy Fraser ficou marcada por um enorme erro que a fez fechar o seu coração e deixar para trás as recordações de todos os verões passados junto ao lago diante da sua casa de férias perto de Ontário, no Canadá. No elegante apartamento em que agora vive, já nada a liga à pequena comunidade de Barry’s Bay nem a Sam Florek, o homem que em tempos ela julgara que haveria de fazer parte da sua vida para sempre.

Durante seis maravilhosos verões, Percy e Sam tinham-se tornado inseparáveis, desfrutando de longos banhos no lago, de noites quentes à beira da água, de leituras dos seus livros favoritos no aconchego da companhia um do outro e até do trabalho no restaurante da família dele em algumas ocasiões. Unidos por um sentimento tão puro, nada parecia ser capaz de ditar o seu afastamento. Até ao dia em que uma má decisão deitou tudo a perder.

Quando, mais de uma década depois, Percy regressa a Barry’s Bay para assistir ao funeral da mãe de Sam, todas as memórias da ligação que sempre os uniu vêm de novo à tona. Mas Percy precisa de se confrontar com os fantasmas do seu passado antes de poder pensar sequer em seguir em frente.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Águas Passadas

A minha opinião:

Mais do uma vez ouvi o João Tordo falar neste thriller e mesmo não sendo uma das suas maiores fãs não podia deixar de o ler, quando um novo livro com as mesmas personagens está prestes a sair. Contudo, parece que isso está a mudar porque li compulsivamente este thriller.

Pilar Benamor é uma personagem incrivel. "Avariada" como convêm a um bom thriller. Esperava que a ligação com Cícero Guzmán fosse mais presente na trama mas é um dinâmica que mantêm o leitor em suspense sem discernir o culpado dos crimes. 

Mal posso esperar para ler o próximo.

Autor: João Tordo
Páginas: 526
Editora: Companhia das Letras
ISBN: 9789897841071
Edição: Junho/2021

Sinopse: 
Durante treze dias de Janeiro de 2019, a chuva cai sem misericórdia sobre Lisboa. É quando aparece a primeira vítima, na praia de Assentiz: uma jovem de quinze anos trazida pela maré. O seu corpo apresenta marcas de sofisticada malvadez. A primeira agente no local é Pilar Benamor, uma subcomissária da PSP cuja coragem e empenho em descobrir a verdade ocultam segredos dolorosos.

A jovem vítima é Charlie, filha de um empresário inglês, mas logo a vítima de um segundo crime brutal um rapaz de dezassete anos aparece na floresta de Monsanto, em condições inenarráveis. Estas duas mortes prematuras e violentas abrem caminho a uma investigação que irá descarnar a alta sociedade portuguesa e o submundo do crime.

Ao longo desse inclemente mês de Inverno, Pilar desbrava caminho na investigação, contra tudo e todos e com a ajuda de Cícero, um misterioso eremita.

Desobedecendo a ordens superiores e colocando a própria vida em risco, vai penetrar no mundo escuro e tenebroso de um psicopata, enquanto luta com os fantasmas que há muito carrega: um pai polícia que morreu em serviço, um vício que a consome e a vulnerabilidade num mundo dominado por homens.

Depois da estreia no género com A Noite em Que o Verão Acabou, João Tordo regressa com um policial de ritmo imparável e delicada sensibilidade, que vai ao âmago dos nossos piores medos.