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domingo, 28 de junho de 2015

O Caçador do Verão

Autor: Hugo Gonçalves
Edição: 2015/ junho
Páginas: 200
ISBN: 9789897412806
Editora: casa das letras

Sinopse:
Quando José é convocado pelo velho patriarca da família, com quem não fala há anos, a sua perplexidade é enorme e, por isso, inescapável a recordação do verão de 1982, em que o avô – nadador de longas distâncias e anticomunista fanático, a quem o cancro levou todas as mulheres – o foi buscar a uma aldeia algarvia onde a mãe o deixara com uma estranha, decidido a tornar-se o pai que ele nunca tivera.
Foi nesse verão que a perigosa quadrilha de Mancha Negra fugiu da cadeia, provocando uma caça ao homem sem precedentes que deixou o País em sobressalto; que José mergulhou da rocha mais alta e que foi atingido por um raio, julgando assim ganhar os superpoderes necessários para descobrir o paradeiro dos bandidos e resolver o mistério do desaparecimento da mãe; e que, na companhia de um rafeiro chamado Rocky e de três amigos extraordinários, viu nascer dentro de si uma força e uma ferida que, mais tarde, o levariam a tentar corrigir os males do mundo pelas próprias mãos. As memórias da vida numa mansão do Estoril, com o avô austero, uma tia devota e uma prima cúmplice, levam-no a regressar à serra algarvia 30 anos depois, para resgatar o que ficou dessas férias grandes, descobrindo, afinal, o que precisava de saber sobre si próprio.
O Caçador do Verão é um romance fascinante sobre a importância da família e da infância nas nossas vidas, que recupera um tempo em que Portugal se aproximava velozmente da Europa, com tudo o que isso tinha de grato e fatídico.

A minha opinião:
Bom, muito bom. Como gostamos e queremos que seja. Um romance que nos faça reviver outros tempos e outros lugares de boa memória e sem perder a noção do presente. 

Um salto no passado, nomeadamente nos anos 80, para recordar dias marcantes de inocência e de sentido, no contacto com a família e com os outros que chamávamos de amigos, e simultaneamente o regresso ao presente no verão de um caçador que procura a tranquilidade de uma vida aprazível com moderados luxos e confortos, sem que sinta o apelo de agir para se fazer justiça. Um balanço de uma vida longe de terminar, em que a doença rondou os mais chegados e urge recomeçar. 

Tempo que passa mas não passa em vão. Emoções à Flor da Pele que perpassa numa escrita enérgica, num crescendo de intensidade a percepcionar o final. 
Algumas emoções que partilhamos através desta leitura são vivências quotidianas ou exemplos próximos. 

José é o narrador e o protagonista desta historia onde o Avô tem um importante papel. Depois de um afastamento de anos, o encontro avizinha-se difícil mas uma alteração súbita do estado de saúde do avô adia a comunicação e precipita a reflexão, bem como a deslocação para o sul do País.
Um ir e vir do presente ao passado sem atrito e confusão, que tem algo de autobiográfico, como provavelmente acontece em tantos outros romances. Mais um escritor lusitano a registar para acompanhar. 

O fragmento que se segue um tanto revela:

"José não podia deixar de pensar que, no século XXI, num país democrático, sem guerra, sem opressão, homens com mais de quarenta anos ainda lutavam pelo direito de ser outra coisa e buscavam a sua identidade, tal como em crianças combatiam as restrições que os adultos impunham ao movimento e `a velocidade. (...)
Todos faziam parte, mas todos tinham também uma vida contraria, uma força que se opunha ao instituído, uma procura que os desassossegava desde sempre e que jamais encontrava apaziguamento - nem nos casamentos, nem nas contas bancarias ou sequer nas famílias. Uma luta permanente entre a necessidade da ordem e as exigências do ego."          (pag. 86/7)   
   

domingo, 21 de junho de 2015

Coisas Que Uma Mãe Descobre (e de que ninguém fala)

Autor: Filipa Fonseca Silva
Ilustração: Sofia Silva
Edição: 2015/ março
Páginas: 152
ISBN: 9789722529549
Editora: Bertrand Editora

Sinopse:
Cheio de humor e algum sarcasmo, este é um livro indispensável para pais recentes, que descobrem algumas dicas de como lidar com as situações mais inesperadas, para pais experientes, que se vão rever em muitas das peripécias descritas, para pais grávidos, que vão poder preparar-se para o que os espera, e ainda para todos aqueles que nunca quiseram ser pais e que precisavam de novas razões para continuarem a não querer.

Uma compilação de crónicas em que Filipa Fonseca Silva partilha a sua experiência na grande aventura da gravidez e maternidade e que, graças às ilustrações da talentosa Sofia Silva, pode ser completado com fotografias e notas de quem o lê, tornando-se, no final, um divertido álbum de recordações sobre o incrível mundo das mães.

A minha opinião:
É inexplicável e quiçá absurdo o apelo que certos livros exercem sobre nós, que assim que nos acercamos deles, abrimos e lemos sem parar, para mais adiando outras leituras. Esta escritora que não conheço excepto pela escrita e com a qual tenho uma afinidade empática, tem esse efeito. Coisas que uma mãe descobre, proporcionou-me uma deliciosa vertigem de reconhecimento com o que sei e não esqueci sobre a experiência da maternidade (que repeti). O sentido de humor e sentido critico, bem como a lucidez estão bem presentes nesta narrativa que nos faz encarar o bom e o difícil desta viagem de emoções e sentimentos quando um novo ser invade a nossa vida. Tudo muda na nossa rotina e hábitos, na relação com os outros, sejam eles próximos e íntimos ou mais afastados, o que não é necessariamente mau mas diferente. Um novo ciclo que podemos relativizar nos dramas quotidianos com humor. Nem todos conseguem. 

Cada vez mais, gosto de ler livros de autores portugueses, que nos "falam" ao coração. Alguns, não dispenso e é tão gratificante ler uma narrativa bem escrita e sentida. Para mais, só lendo. E não se esqueçam de reparar nas imagens e nos espaços de notas que podemos tornar tão pessoal.    

sábado, 13 de junho de 2015

A Rapariga no Comboio

Autor: Paula Hawkins
Edição: 2015/ junho
Páginas: 320
ISBN: 9789898800541
Editora: TopSeller

Sinopse:
O livro que vai mudar para sempre o modo como vemos a vida dos outros. 
Todos os dias, Rachel apanha o comboio...
No caminho para o trabalho, ela observa sempre as mesmas casas durante a sua viagem. Numa das casas ela observa sempre o mesmo casal, ao qual ela atribui nomes e vidas imaginárias. Aos olhos de Rachel, o casal tem uma vida perfeita, quase igual à que ela perdeu recentemente.
Até que um dia...

Rachel assiste a algo errado com o casal... É uma imagem rápida, mas suficiente para a deixar perturbada. 
Não querendo guardar segredo do que viu, Rachel fala com a polícia. A partir daqui, ela torna-se parte integrante de uma sucessão vertiginosa de acontecimentos, afetando as vidas de todos os envolvidos.

A minha opinião:
Muitos são já os comentários sobre este livro, e eu que procuro ser um pouco contracorrente não lhe resisti. Mais pela sinopse do que pela publicidade, uma vez que também eu me desloco em transportes públicos para o trabalho e deixo-me levar pela imaginação enquanto observo vidas alheias. Claro que isto só acontece quando não estou embrenhada num livro e não esqueço tudo o resto. Mas a premissa para esta estória passa um pouco pelo ideal de casal perfeito com uma vida idílica, que procuramos ver e copiar de exemplos próximos. E como nos podemos iludir! Mentiras, meias verdades e falsidades contadas para aparentar melhor, mais forte ou mais interessante, num jogo de faz-de-conta. Um mero exercício de poder.   

Rachel é a primeira de três personagens femininas a se dar a conhecer e a dar voz ao seu sentir, recuando ao passado sempre que necessário para justificar o seu ponto de vista. Uma mulher perturbada pela perda que embarcou no vicio do álcool que destruiu o seu casamento. Anna é a rival que persegue e Megan, a mulher que admira, até um dia. Não são personagens virtuosas e ao longo de toda a estória ficamos a saber o que existe de mais relevante e negro na alma destas mulheres que buscam ser felizes e não o são, numa trama bem urdida e algo intrincada como qualquer bom thriller que se preze. Não teve o mérito de me agarrar no inicio, mas conseguiu-o mais tarde, apesar de ter descoberto o criminoso com alguma antecipação, não perdi o interesse no perfil psicológico das personagens envolvidas.  Ainda assim, ficou um pouco aquém das minhas elevadas expectativas.  

sábado, 6 de junho de 2015

DESAMPARO

Autor: Inês Pedrosa
Edição: 2015/ fevereiro
Páginas: 320
ISBN: 9789722056694
Editora: DOM QUIXOTE

Sinopse:
A saga de uma mulher, Jacinta Sousa, que foi levada do colo da mãe para o Brasil aos três anos e regressa para a conhecer mais de cinquenta anos depois é o ponto de partida deste extraordinário romance de Inês Pedrosa. “No Brasil eu sempre fui a Portuguesa; em Portugal, passei a ser a Brasileira".
Numa escrita inteligente, límpida e plena de humor, a autora cria um universo singular, uma aldeia em que se cruzam personagens e histórias de vários continentes.
Emigrações e imigrações de ontem e de hoje, seres solitários e escorraçados que procuram novas formas de vida, enquanto tentam sobreviver à maior depressão económica das últimas décadas.
O amor, a traição, o poder, a inveja, o ciúme, a amizade, o crime, o medo, a vingança e sobretudo a morte atravessam este livro que faz a radiografia do Portugal contemporâneo, num enredo cheio de força e originalidade.

A minha opinião:
Suponho que este seja o segundo livro que leio de Inês Pedrosa. Do primeiro, não me recordo. Este, dificilmente esquecerei.

Desamparo parece-me o titulo adequado. Um estado de espírito presente na sociedade actual. Solidão e medo grassam em pessoas de diferentes condições que o sentem por diferentes motivos. Os afectos substituídos por exibicionismo virtual com valores materiais pouco compensadores. Mas apesar de tudo isto, não é um romance cinzentão e amargurado como a capa o demonstra, com o vivo amarelo a iluminar a imagem.

A acção passa-se num meio rural  - aldeia de Arrifes, no turístico Lagar, onde o imaginário atribui algumas características como a bonomia e a qualidade de vida. Tantas são as vicissitudes como se percebe neste romance. 
A proximidade através do meio ambiente que reconheço e a empatia por personagens como Jacinta e o filho Raul, em contrapartida com a aversão por outras personagens menos dignas, que consideram apenas os seus interesses pessoais, tornam este romance marcante e até divertido.   

"Jacinta era uma mulher do mundo, observadora e arguta;" com muitas memorias para contar. Raul era um arquitecto de meia idade e sem amor, num país que não premeia o mérito. Estas duas personagens são elo de ligação com outras na pequena comunidade, que dão vida a este romance. Passado e presente, porque todos trazem "bagagem". Uns que chegam e outros que partem, uns que regressam e outros não. 

Despretensioso e bem escrito, como eu gosto. Visualizo os lugares e as pessoas nas palavras de Inês Pedrosa. Reencontrei o que sei em parcas palavras. Com um sorriso nos lábios e sem muitas delongas.