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quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O Último dos Nossos

Autor: Adélaïde de Clarmont-Tonnerre
Edição: 2017/ outubro
Páginas: 412
ISBN: 9789897243981
Tradutor: Miguel Serras Pereira
Editora: Clube do Autor

Sinopse:
Do inferno da Europa, em 1945, à Nova Iorque hippie. Neste romance premiado com o Grande Prémio do romance da Academia Francesa, Adelaide de Clermont-Tonnerre conta a história dos anos loucos vividos na pele por dois genuínos filhos do século XX: Werner Zilch, nascido na Alemanha no estertor da Segunda Guerra Mundial, e Rebecca Lynch, herdeira de um homem de negócios e de uma mulher que logrou escapar com vida ao campo de concentração de Auschwitz. Uma paixão louca e proibida num cenário histórico repleto de reviravoltas e marcado pelo suspense.

Werner Zilch é um jovem carismático e empreendedor. Adotado desde tenra idade, vê-se confrontado com a descoberta das suas origens, tudo menos gloriosas. Aos olhos dos outros, pode ser considerado responsável pelos erros cometidos pelos seus antepassados? Como aceitar que o seu progenitor estivesse ligado ao nazismo?

A par das personagens, surgem nomes que os leitores por certo reconhecerão, todos eles figuras marcantes do seu tempo. A saber: Andy Warhol, Truman Capote, tom Wolfe, Joan Baez, Patti Smith, Bob Dylan...

Uma complexa história de amor que é, ao mesmo tempo, um capítulo ficcionado da nossa História. O leitor não conseguirá pousar o livro enquanto não descobrir quem é, na verdade, «o último dos nossos». No fim, fica a pergunta: estaremos condenados a responder pelos crimes e pelo sofrimento dos nossos pais e avós?

A minha opinião:
Dar e receber livros é um prazer! Neste caso, recebi. E rejubilei com isso. Obrigado Clube do Autor.



A Segunda Guerra Mundial teve consequências que se prolongam no tempo. Alguns recordam, outros procuram esquecer ou ignorar, e há quem procure saber. Esta é a história de Werner e também de Rebecca, que procuram saber tudo o que seja possível apurar sobre o passado dos seus antecessores. A narrativa decorre em dois tempos alternadamente -passado próximo - com início em Manhattan, 1969 e Saxe, Alemanha, 1945 - passado mais distante - com dois acontecimentos impactantes. E a expetativa aumenta a cada página. O entendimento também.  

Werner Zilch é um personagem forte e temperamental, que não é particularmente carismático. Exemplo da concretização do sonho americano, graças ao apoio do sócio e grande amigo Marcus Howard, apaixona-se por uma mulher muito especial como é Rebecca, uma artista, e vivem uma turbulenta e contrariada relação. Por fim, decidem vingar o passado. 


Muitos são os romances que têem como tema a Segunda Guerra Mundial. Alguns li, outros adio (ainda). Sei que a História (realidade) supera a ficção e o "O Último dos Nossos" é mais uma bem engendrada trama sobre o génio e a bestialidade humana que, com rostos idênticos se podem confundir como os irmãos Kasper e Johann Zilch, e assim a infâmia perigar os grandes feitos ou impôr-se para a destruição e morte. 

Não tão envolvente como eu suspeitava, é um romance que se lê com interesse e avidez, enquanto se procura descobrir quem é quem, numa escrita objetiva e corrente, sem subterfúgios e delicadezas. 

Gostei e recomendo.

sábado, 25 de novembro de 2017

A Menina Silenciosa

Autor: Michael Hjorth e Hans Rosenfeldt
Serie: Sebastian Bergman (Vol. 4)
Edição: 2017/ novembro
Páginas: 564
ISBN: 9789896653125
Tradutor: Jorge Pereirinha Pires
Editora: Suma de Letras

Sinopse:
Suécia. Uma bonita casa branca, de dois andares. Dentro, uma família brutalmente assassinada - mãe, pai e duas crianças pequenas, mortos a tiro, em plena luz do dia. E o assassino escapou. Sebastian Bergman, com o Departamento de Investigação Criminal, tenta deslindar o crime, mas, com o principal suspeito morto, está num beco sem saída. Até que descobre que há uma testemunha do crime.
Uma menina, Nicole, viu tudo e fugiu, assustada. Quando a encontram, descobrem que o trauma do que viu a deixou totalmente muda, comunicando apenas através de caneta e papel. Os seus desenhos revelam um facto convincente e inescapável: ela viu o assassino. Bergman fica obcecado com o desafio de romper a parede de silêncio de Nicole. Enquanto isso, o assassino está apostado em garantir que ela fique calada.


A minha opinião:
Chateou-me levar este romance policial para todo o lado, contudo sabia que não me iria conseguir separar dele e que todos os momentos livres seriam aproveitados para ler mais um pequeno capítulo. Mais um e não último livro da série Sebastian Bergman. Ainda bem. Não o podia perder e não quero perder o próximo. E assim, um grande livro lê-se num instante.

O início é a percepção de duas crianças. E um assassinato brutal e frio de uma familia com duas crianças. A Unidade de Homicídios da Polícia Sueca conhecida como Riksmord é chamada a intervir. A equipa, de cinco elementos, está um tanto desiquilibrada, uma vez que cada um deles se debate com crises pessoais na sequência de acontecimentos anteriores, agravado pela ausência de um dos elementos que se encontra a recuperar. Senti a falta de Ursula. A ligação e interação entre eles e Sebastian Bergman é essencial para o sucesso deste romance. 

Não tão violento como se poderia esperar, consegue supreender com tantas reviravoltas perfeitamente plausíveis e quase casuais. E Sebastian, surge mais conectado com uma testemunha e não só, o que o pode ajudar a recuperar da culpa e da dor da perda da sua própria familia.  Mulherengo, impaciente e arrogante é um psicólogo criminal carismático.

Possivelmente, o melhor livro da série Sebastian Bergman desta dupla de escritores. A perseguição do assassino à única testemunha é realmente trepidante. E o final, mais uma vez, deixou-me admirada e empolgada. A seguir... 

domingo, 19 de novembro de 2017

O Meu Nome Era Eileen

Autor: Ottessa Moshfegh
Edição: 2017/ maio
Páginas: 264
ISBN: 9789896652418
Tradutor: José Remelhe
Editora: Alfaguara

Sinopse:
O Natal é uma época que tem muito pouco para oferecer a Eileen Dunlop, uma rapariga modesta e perturbada, presa a um emprego enfadonho como secretária num instituto de correção de menores e forçada a cuidar de um pai alcoólico. Eileen tempera os seus dias vazios com fantasias perversas e sonhos de fuga para uma cidade grande. Enquanto não o consegue, entretém-se a fazer pequenos furtos na loja de conveniência e a fantasiar com Randy, um guarda do reformatório com corpo de homem e cabeça de rapaz. Quando Rebecca Saint John, uma ruiva vistosa, alegre e inteligente, é contratada como a nova psicóloga do reformatório, Eileen é incapaz de resistir à sedução de uma amizade que promete transformar a sua vida. Mas, numa reviravolta digna de Hitchcock, o poder de Rebecca sobre Eileen converte a rapariga em cúmplice de um crime a que pode ser impossível escapar. Com a paisagem nevada da Nova Inglaterra como pano de fundo, a história de Eileen é arrepiante, hipnótica e divertida.
Com um primeiro romance cheio de força, que agarra e perturba o leitor até à última página, Ottessa Moshfegh faz uma entrada retumbante nas letras norte-americanas.

A minha opinião:
"O Meu Nome Era Eileen" é surpreendentemente bom. Obscuro e empolgante. Não esperava que a degradação, abandono e carência  de Eileen pudesse ser uma leitura tão viciante. A estrutura narrativa em que se permite saber quando e onde se deu a mudança, mas não como e porquê sustenta o interesse. 

Dezembro de 1964,  X-Ville (nome fictício), em Nova Inglaterra, Eileen tinha 24 anos e, conta à posteriori muitos anos depois, a história do seu desaparecimento. A narradora conta tudo o que recorda com uma crueza inaudita e intimista sobre os seus pensamentos e ações enquanto cuidava do pai, um ex-policia alcoólico e vigiava as visitas a  jovens num centro correcional, no âmbito do seu trabalho de secretariado. Estranha e miserável forma de vida. 


Emocionalmente fecunda, mordaz e intensa, recorda a sua paixão platónica por Randy como a sua razão de viver até conhecer Rebeca. A extensão e dramatismo do que conta torna o leitor testemunha dos acontecimentos e simultâneamente cumplice da sua fuga. 

Manual Para Mulheres de Limpeza” de Lucia Berlin esteve presente no meu pensamento enquanto lia a história de Eileen. A mesma profundidade e força que impressiona e assombra. Os pormenores que fazem toda a diferença. Poderosa narrativa que marca. Corajoso primeiro romance de Ottessa Moshfegh. Brilhante! 

domingo, 12 de novembro de 2017

Falcó

Autor: Arturo Pérez-Reverte
Edição: 2017/ agosto
Páginas: 272
ISBN: 9789892340319
Editora: ASA

Sinopse:
Em 1936, no início da Guerra Civil Espanhola, Lorenzo Falcó move-se por entre as sombras do submundo. Ex-contrabandista de armas, espião sem escrúpulos, encontra-se agora a trabalhar para os serviços de inteligência franquistas. A sua missão? Libertar um detido da prisão. Tem Eva Rengel e os irmãos Montero como companheiros. (E, quem sabe, vítimas? Pois os tempos são traiçoeiros, e nada é o que parece.)

Mas surgem imprevistos, há conflitos de interesses, desenterram-se segredos, há torturas, perseguições e massacres. Só que Falcó não é dos que desistem facilmente… e está determinado a levar a cabo uma missão que poderá alterar o curso da História. Será em Portugal, na aparente tranquilidade do Estoril - local favorito entre espiões - que tudo se conclui.

Entrelaçando magistralmente realidade e ficção, Arturo Pérez-Reverte dá início a uma nova saga protagonizada por Lorenzo Falcó, um personagem fascinante, complexo e inesquecível.

A minha opinião:
Não é segredo que gosto muito da escrita precisa de Arturo Pérez-Reverte que abrilhanta os enredos. Com o ex-contrabandista e espião dos anos 30 Lorenzo Falcó fiquei agarrada a um tempo e a um lugar em que se confundiam anarquistas, socialistas, fascistas, comunistas e uma denuncia era sinal de sofrimento e morte sem fundamentação. Os espiões proliferavam e o vil metal era considerado por todos igual. Sem escrúpulos, mulherengo, Falcó não é o heroi romântico que se poderia imaginar. Não luta por uma causa ou ideologia como Eva Rengel, personagen enigmática e aguerrida com quem se envolve. 

"Só disponho de uma vida, disse ele. Um breve momento entre duas noites. E o mundo é uma aventura formidável que não estou disposto a perder." (pag.82)

A Guerra Civil Espanhola. Neste romance, sentimos o ambiente de uma guerra, sem lados para defender ou personagens para acarinhar, mas sem deixar de perceber o comportamento dos intervenientes e sentir o horror, dadas as descrições e observações que constam da narrativa, fruto da investigação e critica do autor. 

Observei a foto de Arturo Pérez-Reverte e não pude deixar de pensar que o protagonista Lorenzo Falcó poderia ser interpretado pelo mesmo numa qualquer boa produção cinematográfica. O sorriso sarcástico e o olhar inteligente e algo cínico tem tudo a ver com o espião sedutor e aventureiro dos anos 30.

O fim em Portugal, nomeadamente no Estoril, encerra bem esta narrativa, sem pontas soltas e que promete continuação. Gostei muito e espero regressar em breve a mais um romance.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Uma Mulher Desnecessária

Autor: Rabih Alameddine
Edição: 2017/ agosto
Páginas: 264
ISBN: 978-972-0-03008-5
Tradutor: Tânia Ganho
Editora: Porto Editora

Sinopse:
Aaliya Saleh vive sozinha no seu apartamento em Beirute, rodeada por pilhas e pilhas de livros. Sem Deus, sem pai, sem filhos e divorciada, Aaliya é o «apêndice desnecessário» da sua família. Todos os anos, ela traduz um novo livro para árabe, e depois guarda-o. Os trinta e sete livros que Aaliya já traduziu nunca foram lidos por ninguém. Depois de ouvir as vizinhas, as três «bruxas», a criticar a extrema brancura do seu cabelo, Aaliya tinge-o… de azul.

Neste assombroso retrato da crise de idade de uma mulher solitária, os leitores seguem a mente errante de Aaliya, à medida que ela vagueia pelas visões do passado e do presente da capital do Líbano: reflexões coloridas sobre literatura, filosofia e arte são invadidas por memórias da guerra civil libanesa e do próprio passado volátil de Aaliya. Ao tentar superar o envelhecimento do corpo e as inoportunas explosões emocionais que o acompanham, Aaliya é confrontada com um desastre impensável que ameaça estilhaçar a quietude da vida que ela escolheu para si mesma.

A minha opinião:
SUMPTUOSO!

Um romance para se ler devagar porque Aaliya Saleh é uma protagonista resilente, solitária, culta e inteligente que importa conhecer e apreender. Uma verdadeira leitora e uma leitora voraz que dedicou a sua vida a uma causa sigilosa como tradutora e refere amiude os grandes autores clássicos e contemporâneos com admiração e espirito critico. Entrar na vida desta mulher sujeita a pressões familiares, com uma única amiga Hannah, que perdeu, e três "bruxas" "brancas" por vizinhas que a amparam quando o desastre acontece, é um privilégio e não tenho a eloquência dela para o contar.

"Uma mulher desnecessária" é uma mulher necessária na vida de qualquer livrólico assumido, como eu. Uma referência literária, certamente, que muito beneficiou com  a tradução exemplar em que o belo e singular desta protagonista não se perdeu, antes se enalteceu.

Prosa sentida, linguagem requintada e narrativa inspirada, em que a história e a politica estão lado a lado com a humanidade e as descrições sem serem excessivas são as suficientes para captar a ligação de Aaliya à cidade e ao lar que nunca abandonou durante a Guerra Civil.

Um romance para ler e reler.