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quinta-feira, 22 de junho de 2023

Viradas do Avesso

 

A minha opinião:
"Ouvi"falar deste livro mas não senti que fosse para mim, por muito que gosto de livros leves, ou melhor, que se saiba à priori que terminam bem. E protelei... mas um livro sobre uma amizade desde a infância entre vizinhas que no final da adolescência se separaram porque uma desapareceu suscitou a minha curiosidade. E apesar da escrita é uma história que prende e agrada por empatia com as três personagens e alguma proximidade em vivências que guardamos na memória. 

Um livro focado no comportamento e relacionamento humano. O peso da infância e o relevo da memória. As decisões que nos afastam dos afetos. Um romance que se acarinha pela evidente inspiração da Joana Kabuki numa história saída de sentimentos fraternos. Um livro conforto. 
A quebrar esse registo o drama e o mistério da Berta que se quer revelado e que a autora vai sabendo desenrolar sem enredar. 
Uma profunda amizade entre três mulheres.
Bonito mas não me emocionou ou tocou como esperava.

Autor: Joana Kabuki
Páginas: 272
Editora: Clube do Autor
ISBN: 9789897246777
Edição: maio/2023

Sinopse:
Fascinada pelo comportamento e pelas relações humanas, Joana Kabuki escreve sobre sentimentos universais e leva-nos a refletir sobre como, muitas vezes, vivemos aprisionados no tempo. Um romance sobre a relatividade das memórias, o peso do passado e a derradeira escolha sobre quem queremos ser quando a vida nos vira do avesso.

Berta, Alice e Carlota são inseparáveis. Jovens e inocentes, desconhecem que a força do passado não encontra limites. Na sequência de um trágico acontecimento, Berta desaparece. A brutalidade dos eventos muda irremediavelmente as suas vidas, condicionando as suas escolhas e os seus caminhos.

Vinte anos depois, Berta reaparece de forma tão enigmática como desaparecera. O reencontro das três mulheres origina o desfiar de memórias difusas e revela segredos e traumas há muito encarcerados. Ao invés de verem sarar as feridas, confrontam-se, uma vez mais, com novos e profundos golpes.

Qual o verdadeiro motivo que levou ao desaparecimento?
Passados tantos anos, serão capazes de desenlear o nó das suas vidas e reconciliar-se com o passado e consigo próprias?

domingo, 18 de junho de 2023

Uma Herança

 

A minha opinião:

Gosto de uma história escorreita, ágil, que não se perde em detalhes em que o foco é a ação e rapidamente percebemos o que o autor nos quer contar. Também por isso gosto de contos e como tal, não resisto a livros pequenos, desde que a sinopse me atraia, como foi o caso. Desengane-se quem julga que é um livro juvenil ou um livro de fábulas mas é um romance de encantar em que as aves e a fulgurante natureza latino-americana marcam presença em torno de personagens fascinantes numa saga familiar que se desenvolve a par com Santiago.

A Herança é o que os emigrantes legaram aos filhos que nunca tinham estado na Europa. Um código de classe e um vestígio de uma vida precedente. A Grande Guerra marcou uma fatura no Chile mas a trama não se limita e prossegue para outros grandes acontecimentos do sec. XX em que os Franco-Chilenos participaram numa narrativa épica. Nada melhor do que as palavras do autor:

"Era fascinante como um tribuno, astuto como um leitor de sinas. Sabia cuidar de pausas, arrastar silêncios de tensão narrativa, conter a emoção de uma personagem para não quebrar o ímpeto, explicar sem dizer, inventar uma artimanha para relançar o relato e desenhar uma paisagem tão real, tão fiel, que quem o escutasse tinha a impressão de estar inteiramente lá."

Autor: Miguel Bonnefoy
Páginas: 192
Editora: Edições Asa
ISBN: 9789892356846
Edição: fevereiro/2023

Sinopse:
A casa na Calle Santo Domingo abrigou três gerações da mesma família. O patriarca chegara no final do século XIX vindo de Lons-le-Saunier, em França. Trazia num bolso um pedaço de videira e no outro um punhado de trocos. Queria emigrar para a Califórnia, mas um golpe do destino desviou-o para o Chile. Ao chegar, um mal-entendido na alfândega fez com que fosse rebaptizado com o nome da sua terra natal - e assim nascia a família Lonsonier.

Anos mais tarde, o filho Lazare regressaria das trincheiras infernais da Primeira Guerra Mundial para se instalar nessa mesma casa com a mulher, Thérèse, construindo no jardim o mais belo aviário dos Andes, que serviria de berço à filha de ambos, Margot. A criança, cuja primeira visão do mundo foi a de cinquenta pássaros nos seus poleiros, cedo começou a sonhar com as alturas, tornando-se uma aviadora pioneira e mãe de um revolucionário, Ilario Da.

Ao longo do século XX, de duas guerras mundiais e de dois continentes, os Lonsonier mantiveram viva a lenda de um misterioso tio desaparecido em França. Mas quando uma tragédia se abate sobre a família, será essa figura mítica a guiá-los de volta a casa.

terça-feira, 6 de junho de 2023

O perigo de estar no meu perfeito juízo

 

A minha opinião:

Nota prévia: Adoro o título.
Óbvio dado que trata a ligação entre a criação e loucura e sem emitir muito do saber próprio.

A fluidez da narrativa parece encetar um diálogo como o leitor, assim como acontece noutros livros da Rosa que encantam. Muitos escritores e muitas referências literárias que adorei reconhecer em que a curiosidade levou a melhor. O mais importante é desmistificar as perturbações mentais. e para o efeito fez uma dedicada investigação para nos presentear com as suas ilações. O que convenhamos também a deve ter divertido. Muitas reflexões.
"Não consigo incorporar-me na minha verdadeira idade." "Assim andamos todos pelo mundo à caça dessas pequenas bolhas de vida extraordinária."
Muito bom. É provável que releia este livro.
Não é uma história corrida mas é Rosa no seu melhor. 
Nota final: Há uma história de fundo com A outra. 

Autor: Rosa Montero
Páginas: 240
Editora: Porto Editora
ISBN: 978-972-0-03653-7
Edição: fevereiro/2023

Sinopse:
Na tradição de A Louca da Casa, um livro brilhante e sagaz sobre criatividade e loucura
«Sempre soube que na minha cabeça alguma coisa não funcionava muito bem», diz nos logo ao início Rosa Montero. Voltando ao solo fértil que alimentou A Louca da Casa, esta sua convicção encontrou eco em estudos científicos e dados concretos, mas sobretudo na observação da sua própria vida e nas biografias desses «loucos» e «estranhos» seres dedicados, como ela, à arte da escrita, almas que transformaram o sofrimento pessoal em matéria literária. Sylvia Plath, Emily Dickinson e muitos outros estão presentes nestas páginas repletas de empatia pelos dramas humanos e, ao mesmo tempo, de admiração por toda a beleza daí resultante.
O perigo de estar no meu perfeito juízo prova a capacidade extraordinária de Rosa Montero de misturar ficção, autobiografia e ensaio, resultando numa obra perspicaz, tocante e bem-humorada sobre o custo da «normalidade» e o valor da diferença.

sexta-feira, 2 de junho de 2023

Hard Land - Duros Anos

 

A minha opinião:

Hard Land é no Missouri nos anos oitenta. Sam e Kirstie são jovens e vivem um verão marcante numa terra dura com um misto de euforia e melancolia. Cameron  e Hightower são  amigos e os quatro vivem as dores do crescimento.

Benedict escreve maravilhosamente a ponto de nos comover e a sensação é a de que assistimos a um daqueles filmes clássicos de que nem sabiamos que tinhamos saudades. Uma experiência de leitura incrivel sobre a incerteza e ternura do primeiro amor à revolta com a maior perda.
"A realidade nunca foi tão bela como sonhar com ela."

Lindo romance!

Autor: Benedict Wells
Páginas: 304
Editora: Edições Asa
ISBN: 9789892357034
Edição: abril/2023

Sinopse:
Para fugir aos problemas em casa, Sam, de quinze anos de idade, arranja um trabalho de férias num velho cinema. O seu objetivo é apenas ocupar as longas horas do verão abrasador e entediante. Porém, o trabalho aparentemente desinteressante abre uma porta para um novo mundo. O cinema decadente e os jovens que lá trabalham vão transformar esse verão em algo mágico e memorável, incentivando Sam a sair da sua zona de conforto. Com os novos amigos, conhece os segredos da cidade e, mais surpreendentemente, descobre o amor. Pela primeira vez, não se sente só. Pertence verdadeiramente ao mundo.

Esta é a história de Sam e do verão que ele nunca irá esquecer. Mas em cada recanto idílico da memória, em cada época dourada do passado, há sempre uma mancha que nos lembra que não foi tudo perfeito. Há sempre algo nosso que fica irremediavelmente para trás.

Hard Land - Duros Anos transporta-nos para os lugares mágicos - físicos e emocionais - que marcam a nossa vida e se inscrevem indelevelmente nas nossas histórias pessoais. Um emocionante tributo aos anos 80 e a filmes como Stand By Me e The Breakfast Club.

Véspera

 

A minha opinião:

Depois de ler "Tudo é Rio" não podia deixar de ler os outros livros de Carla Madeira. Em "Véspera" dá se o mesmo fenóimeno. Uma narrativa tão fluída e vertiginosa que nos arrasta em turbilhão com a respiração suspensa desde o primeiro capítulo. Vence qualquer fastio e é um verdadeiro desafio interromper a leitura. As personagens ganham uma dimensão humana e convivem connosco com as fraquezas e grandezas.

Mães que perdem as estribeiras em tortuosos casamentos em dois enredos que se cruzam e avançam em opostos sentidos e enquanto um é em contagem crescente o outro é em decrescente. Bem contado não quebra o ritmo porque se foca na ação sem desperdício de detalhes numa prosa quase poética mas objetiva que é empolgante e viciante porque a fórmula passa por iniciar com um episódio bombástico. Sem esquecer Caim e Abel. 
Uma extraordinária contadora de histórias.

Autor: Carla Madeira
Páginas: 280
Editora: Record
Edição: novembro/2021


Sinopse:


Carla Madeira cria personagens que parecem estar vivos diante de nós. As emoções que sentem são palpáveis e suas reações, autênticas. Temos a sensação de conhecê-los de perto, inclusive as contradições e os pontos cegos. Tal virtude é evidente em seu livro de estreia e grande sucesso, Tudo é rio (2014), mas também no livro seguinte, A natureza da mordida (2018).

Os personagens de Véspera, este seu novo romance, possuem a mesma incrível força vital. Mas se em Tudo é rio Carla os criou com poucas pinceladas e traços incisivos, aqui, para delinear suas personalidades, ela opta por uma superposição de camadas psicológicas. Se antes eles primavam por temperamentos drásticos ― capazes de extremos de paixão, ciúme, ódio e perdão ―, aqui a estratégia gradativa de composição confere-lhes uma dose maior de mistério, sugerindo ao leitor antecipações que só aos poucos se confirmam, ou não. A força emocional continua existindo, porém está menos visível, o que deixa a atmosfera ainda mais carregada de suspense e tensão.

A narrativa começa com a pergunta: como se chega ao extremo? Vedina, uma mulher destroçada por um casamento marcado pelo desamor, em um momento de descontrole abandona seu filho e, imediatamente arrependida, volta para o lugar onde o deixou e não encontra quaisquer vestígios de sua presença. Este é o acontecimento nuclear da trama que expõe as entranhas de uma família – pai alcóolatra, mãe controladora, irmãos gêmeos tensionados pelas diferenças – que, como tantas outras famílias, torna-se um lugar onde as singularidades de cada um não são acolhidas, criando rachaduras por onde a violência se infiltra.

Contada em dois tempos, o dia do abandono e os dias que vieram antes dele, o romance avança como duas ondas até que elas se chocam e se iluminam. O leitor se vê diante de um espantoso presente que expõe o quanto as palavras são capazes de inventar a verdade.

O Quarto do Bebé

 

A minha opinião:

Um diário intimo num tempo de clausura. Uma obscessão. Uma catarse. Um encadeado de pensamentos, memórias e sentimentos que focam preocupações mundanas e pessoais que são transversais e prendem qualquer leitor numa escrita bela, ponderada e serena que vicia. O diário de Ester do Rio Arco. A maturidade e lucidez de quem conseguiu refletir e transpor para um romance autoficcional sábias palavras.

Não consegui não fazer um paralelo com o livro de Lara Vaz Pato que li recentemente. A mesma escrita sublime da essência de uma mulher. Os temas vão desde a doença, a morte, a infertilidade, a pobreza e até algumas referências literárias. As limpezas como forma de expurgar o que se quer eliminado numa exaltação materna. E no fim a superação.

Autor: Anabela Mota Ribeiro
Páginas: 232
Editora: Quetzal
ISBN: 9789897229190
Edição: maio/2023

Sinopse:
Escrito em grande parte durante o confinamento e a doença, e concluído após uma longa gestação, O Quarto do Bebé é um romance autoficcional em forma de diário íntimo.

Depois da morte de um conhecido psicanalista, a filha, sua única herdeira, encontra entre os papéis que ele deixou o diário de uma paciente. Tem título - Fala Orgânica - e está assinado: Ester do Rio Arco. O que começou por ser uma curiosidade transformou-se numa obsessão e objeto de leitura compulsiva. Neste manuscrito, a filha do psicanalista vai encontrar não apenas uma forma de conviver com o pai, como também inúmeros pontos de identificação com a paciente dele.

Os temas são os do dia a dia do isolamento e da doença, a escrita, o corpo, a mutilação, a relação com a mãe e com as origens, a ligação profunda a uma amiga (figura tutelar e espécie de mãe de Ester) e a morte dela. Em suma, a perda, a infertilidade, maternidade e filiação, nascimento e morte. O arco narrativo desenha-se a partir do que poderia vir a ser um quarto de bebé, mas que nunca albergará uma criança, até à transformação desse quarto num lugar físico e mental de criação, nomeadamente da escrita.

Daqui emerge ainda um retrato antropológico do país em que os pais estiveram na guerra e as mães escreveram aerogramas, e é exposta a violência que a sociedade patriarcal exerce sobre as mulheres. Com ecos do universo literário da recentemente nobelizada Annie Ernaux, uma das grandes referências da autora, O Quarto do Bebé é um relato cru e corajoso que revela uma nova e envolvente faceta de Anabela Mota Ribeiro.

Quem Sabe

 

A minha opinião:

Há urgência nas palavras de Pauline. Uma alma inquieta e algo atormentada mas determinada na busca da sua identidade antes de dar à luz uma nova identidade. O que suscita muitas questões no leitor. Quem é esta mulher que não sabe tanto de si aos trinta anos? O que é que se pode esperar? Um romance que provoca uma certa ansiedade dada a escrita vertiginosa mas que é justificado quando se percebe o que sucedeu a Pauline no dia branco.

Não sei se será do agrado de muitos leitores mas eu gosto de estórias de vida ou de fragmentos em que esquecemos que se trata de ficção. Gosto de pessoas "avariadas" que exprimem o que sentem. É um romance diferente, honesto e sombrio. Introspectivo. Não amei porque não senti empatia. Em compensação TuTu, o gato não se esquece.

Autor: Pauline Delabroy-Allard
Páginas: 232
Editora: Alfaguara
ISBN: 9789897848698
Edição: maio/2023

Sinopse:
Na linhagem de Marguerite Duras e Annie Ernaux, Quem sabe é o romance de consagração de uma escritora que vem questionar a fronteira entre vida e literatura.

Aos trinta anos, grávida, Pauline vai tratar do seu documento de identidade pela primeira vez. Descobre então que, além do nome de batismo, possui outros três nomes próprios: Jeanne, Jérôme e Ysé. Não lhes conhece a origem, nem a razão pela qual lhos deram. Na sua família, não se fala sobre passado ou intimidade; na sua família, não se fazem estas perguntas.

Durante o parto, Pauline vive um momento devastador, que deixa marcas e lhe traz de volta as indagações de sempre. Como estratégia de sobrevivência, inicia uma meticulosa pesquisa e decide procurar os três fantasmas do seu nome. Talvez ao descobri-los encontre a salvação, ou os elementos que lhe faltam para reconstruir uma identidade perdida. É então que conhecemos Jeanne, a bisavó louca; Jérôme, imerso na Paris gay dos anos 1980; e Ysé, heroína de um outro romance.

Quem sabe relata o percurso de uma mulher à procura das suas raízes. Dessa busca, emerge um romance sublime sobre maternidade, luto e segredos de família. Esta é a história de uma obsessão, de um périplo e de um renascimento, mas também de uma surpreendente reflexão sobre a literatura.